PAPO DE MÃE
Por que estamos com medo do choro das crianças?
O medo não é da criança. Ou do seu choro. Mas da dor nos nossos ouvidos – causada por ele. E vamos chamar de ouvidos todos os nossos traumas, culpas, incapacidades, inseguranças, comparações, vergonhas, síndromes, faltas.
Temos medo de cutucar os nossos ouvidos – e todos os significados a ele atribuídos – com vara curta. Chegar muito perto de nós. Arrancar a casca da ferida.
O medo do choro das crianças equivale a empurrar a poeira para debaixo do tapete. E vamos chamar de poeira a superficialidade das relações. Do nosso medo do espelho. E do autoconhecimento. E do trabalho que é educar. E do tempo e dedicação que isso requer. E da liberdade que haveria se chegássemos perto disso. Ao invés de ficar tão encurraladas em reprovações autoimpostas.
Enxergo nos comportamentos da minha filha muito do que sempre fui consciente de querer ver. Mas também o contrário. E, pior, ou melhor, esse contrário está mais relacionado a mim do que a ela.
Entendo as ações e reações que se mostram incondizentes com o que eu prego ou como costumo agir, como reações a incapacidades minhas. O grito sou eu me dizendo, a raiva sou eu me voltando contra mim, a irritação é comigo. Eu que não consegui ser firme o suficiente comigo.
Como descobrir isso antes de projetar - esses sentimentos e emoções incompreendidos - em outra pessoa? Eis o xis da questão.
Separar o fato das interpretações seria bom começo. O que um bebê ou uma pessoa na primeira infância precisa? O que é capaz de entender, absorver, filtrar, apreender, do que dizemos, fazemos ou impomos?
Mães que falam muito – se explicam, explicam suas razões e não-razões para justificar uma atitude, terminam por fazer exatamente o que a criança está pedindo. Mas ficam com a sensação de que estiveram no comando.
O que a mãe queria ter dito era “não”. O que a criança miúda precisava ouvir e entenderia bem se tivesse acontecido, era “não”. Mas com medo do que chamei de ‘choro’ e que pode ser qualquer reação que ela (a mãe) não está pronta para ver descortinada, apenas consente.
E a reação, vejam só, pode ser a criança dizer: “Tudo bem”. Ela precisa de limites. Ela estava clamando por braços que a segurassem com firmeza (e gentileza), olhos que a fitassem nos olhos. Pedia direção. implorava para não ser prontamente atendida.
Mas não nos sentimos capazes. Os traumas, culpas, incapacidades, inseguranças, comparações, vergonhas, síndromes, faltas não nos permitem.
Concordo com a educadora Rosely Saião quando diz que “o que temos visto, em geral, são os pais superobedientes".