POR QUE A FILA DOS HOMENS ANDA?
Eu estava recém-casada. Talvez grávida. Não lembro. Um amigo estava namorando. Vivendo os bons presságios da paixão. Sua parceira também se mostrava feliz. Mas a relação continha um ar de mistério. Ela tinha um filho e não queria envolver a criança no seu relacionamento tratado, desta forma, como um segredo. Uma rua sem saída que dava até determinado ponto.
Eu não compreendia bem como era possível. Era como esconder um elefante numa piscina rasa. Também não ficava claro como era possível fazer com que dois alvos de bons sentimentos, talvez amor, pudessem ter vidas separadas. Como água e óleo.
O tempo passou. Meu casamento acabou. Minha filha cresceu. Passei eu também à condição de mulher solteira com uma filha. Ou mãe solo. E agora são inúmeros os exemplos de mulheres que escondem sua vida sentimental dos filhos, tal como aquele que estreou minha consciência sobre tal situação. “Estou num romance. Mas a filha não sabe. Não conta nada”, me disse uma amiga, dia desses. Eu mesma, por vezes, declaro incompatível. Maternidade. Relacionamento afetivo. Adianto-me em dizer a pretendentes: Sou uma mãe.
Já desmarquei um encontro muito esperado pois de repente a filha se pintou toda. Era catapora. O moço disse: eu já tive catapora. Eu não entendi aquilo como um “tudo bem, podemos conciliar encontro e catapora”. Nunca mais nos vimos.
Outra vez, estava indo tomar um café ou algo assim com um, até então, amigo. Quando recebi a notícia que a filha já estava voltando de um passeio e que teria que buscá-la naquele momento. Desci do carro do moço. Nunca mais nos vimos.
Outra vez, essa em um encontro marcado com antecedência, muito esperado, um jantar, o moço perguntou onde estava minha filha para que eu pudesse estar ali. Eu disse que na casa de uma amiga (e que correria tinha sido arranjar aquilo). Nunca mais nos vimos.
Uma vez tive um namorado. Que acolheu. Aceitou. E fez feliz. A nós duas. Por um tempo. Quando a história acabou, tive que lidar com o meu pesar e com o da pequena.
Concluí que era mesmo incompatível. Maternidade. Relacionamento afetivo. Parei de buscar histórias de amor. Passei a focar no meu tempo. Na minha solidão. Na minha solitude. Tirando as indefectíveis lições. Focando. No aprendizado. Fiquei meio ranzinza. Chego a mudar de calçada quando aparece uma flor. Descrente. Dou risada do grande amor.
Mas um belo dia soou o alarme. O que nos faz, mulheres, mães, agir assim? Com uma cobrança tão grande endereçada a nós mesmas. Os homens estavam aí. Dando sua lição. Ensinando como se faz. Como se ama sem medo de filhos. E sem medo de amor. De emendar uma relação na outra. De dizer ‘eu te amo’ a várias pessoas em um prazo de três dias.
Vamos mirar no exemplo desses homens de tão grande coração? Eles não parecem operar com esse tipo de variável – que ainda não sei nomear, mas desconfio que tenha origem em pressões sociais. Em machismo. Em medo da opinião alheia.
Eles apresentam aos filhos “amigas” e namoradas que se sucedem à velocidade da luz. Abrem o flanco para uma convivência íntima e intensa dessas partes tão logo conhecem as amigas/namoradas. Não lhes parece passar pela cabeça que pode haver sofrimento. Dano. Por parte dos rebentos. Que deviam ter mais pudor. Ou respeito. Ou paciência. Que deviam pegar leve e ver se aquela história vai dar certo. Para poder torná-la pública ou inseri-la na vida privada. Como as mulheres são levadas a fazer.
Mas o que diz se uma história dá certo? Se for um dia bom, já não deu? Um jantar. Um encontro. Uma semana. Um mês. Uma ilusão. Uma vontade. Um desejo.
Queremos ser santas aos olhos de quem? Passando também uma mensagem cruzada de que não temos vida afetiva. Amorosa. Sexual. Que apenas seus pais. Os homens. Têm o direito de ter sucessivas amigas/namoradas. Enquanto as mães se desdobram em papeis domésticos que nunca dão conta de todo. Negamos algo muito nosso.
Em nome de quê?
Eu não tenho a resposta. Mas me sinto impelida a buscá-la. Dizem que perguntar já é um avanço. E não ofende.